Archive for fevereiro \25\-03:00 2010

Que tal esta?

25/02/2010

Mato Grosso do Sul. Mulher entra em trabalho de parto, os dois médicos vão às vias de fato, disputando quem faria o procedimento; entrementes, a mulher pare e o bebê nasce morto.

Poxa vida

24/02/2010

Este fim de semana é o último de existência do San Rafael, o buteco sujo pra onde quase invariavelmente nos dirígiamos depois de assembleias, reuniões e outras atividades do movimento estudantil. Já que não estarei lá pra me despedir, permito-me algum drama: nunca mais verei suas mesinhas, as baratas do banheiro, os aparelhos de TV barulhentos sob a luz branca; não mais longas esperas de ônibus ali na frente, aniversários, batatas fritas em horários impróprios e discussões (aos gritos ou aos beijos) sobre quase absolutamente qualquer coisa. Poxa vida, dura vida.

Enquanto isso

23/02/2010

Entre hoje e amanhã, estamos reunidas no Fórum Nacional de Enfrentamento à Violência contras as Mulheres do Campo e da Floresta. Depoimentos de filme de terror. Mas não vou descrever esses fatos, senão vai ficar um blogue de espremer e sair sangue.

O que vou, sim, é relatar três histórias que acabo de ouvir, sobre o que têm dito e feito de inacreditável alguns representantes dos órgãos de segurança Brasil adentro. (Vamos sem nomes, por motivos óbvios.)

Quando há cerca de um ano uma mulher da zona rural de um município do Tocantis foi assassinada com dezenove facadas pelo companheiro, uma militante do Movimento das Quebradeiras de Coco de Babaçu (MIQCB) envolveu-se pessoalmente nos trâmites necessários para que o sujeito fosse responsabilizado. “Para registrar a ocorrência, a gente teve que ir atrás do policial, imprimir as coisas na nossa própria impressora… como se eu fosse a pessoa da segurança pública do município! Eu não gosto desse papel de fazer um papel que não é o meu. Mas a gente se vê na obrigação de ir, para que aconteça uma coisa que está na lei mas não sai do papel.”

Em Várzea Grande, MT, duas irmãs (a mais nova, de onze anos) trabalhavam como vendedoras de picolé. Foram estupradas pelo mesmo homem, ambas engravidaram. A delegada, nos conta uma companheira do Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia (MAMA), não queria encaminhar a denúncia, alegando: “as meninas de nove anos sabem mais de sexo que eu com 40”.

Tocantins novamente. Disse o delegado diante da mulher que queria denunciar o marido agressor: “Olha, dona Maria, a senhora é uma mulher muito bem sucedida. Por que quer fazer isso, envergonhar o seu marido?”. “O delegado disse que não ia registrar porque conhecia aquele senhor”, nos conta uma militante do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC). “Aí a gente tem que descer do salto e dizer pra ele: ‘Olha, então vai viver com ele’.”

Enquanto isso — aqui retomo a fala da Celinha, Secretária Nacional de Mulheres do Conselho Nacional de Seringueiros (CNS) –, “as mulheres continuam morrendo, com o corpo jogado no lixo, como aconteceu recentemente na minha Resex [Reserva Extrativista]”.

À Niobe Xandó

23/02/2010

Morreu Niobe Xandó. Acabo de saber, com quatro dias de atraso, pela Folha, em uma nota de injustificáveis SETE linhas. Prioridades são prioridades. Pesco num caderninho o que escrevi depois de ver uma retrospectiva da Niobe na Pinacoteca.

“21 de maio de 2007

Pela manhã, Pinacoteca e café. Foram retratos de Versalhes, Niobe Xandó e fotografias do Peru.
(…)
Niobe Xandó é brilhante (penso em brilhante de luz, não no sentido por derivação). Dentre os quadros figurativos há auto-retratos com lindos traços verdes e números deliciosamente egóticos (Auto-retrato XXXVI). Santos deveras pagãos. Há flores que tomaram ayhuasca. E há as máscaras africanas, como ato de mediação: em parte, o lastro da referência no real; em parte, a autonomia dada no enxugamento dos traços. E há uns flertes com naïf e art brut – que um bom comentário na parede junto à porta fixa como comparações possíveis ainda que não aplicáveis dogmaticamente à sua trajetória.”

Nunca burilei essa anotação, mas me parece que ela ainda guarda o impacto do que vi.

Engenhocas

22/02/2010

Ontem, fui ao show do Uakti e fiquei encantada.

Os caras vêm contruindo engenhocas (vulgo instrumentos acústicos) ao longo dos últimos 30 anos. A música, ótima, sai da água, de uma espécie de caixa de música com os bofes pra fora, de tubos de PVC, flauta transversal, todo tipo de coisas batucáveis e um grande etcetera.

(Mesmo se a música fosse ruim, os instrumentos são tão bonitos de olhar…)

A segunda música… a primeira teve um pedaço de Elomar (esta canção eu não reconheceria sozinha, por sorte estava com um amigo baiano a tiracolo); e aí veio a segunda, uma ambiência de filme de caubói, tocada à manivela, um troço qualquer coisa de incrível.

Não bastasse, brinde dos grandes: subi as escadas para me deparar com a última meia hora, último dia, da exposição do Goeldi em Brasília.

***

Brasília tem sido gentil no que concerne a shows. Desde que vim pra cá, não fui a muitos, mas todos foram dignos de nota.

Em novembro, durante o V Festival Brasília de Cultura Popular, realizado pela Funarte, assisti (e dancei de suar) ao Samba de Coco Raízes de Arcoverde, Maciel Salu, Carimbó Quentes da Madrugada e Ilê. Em setembro ou outubro teve um Milton Nascimento meio apático na Esplanada, compensado pela noite quente e o cenário alienígena do Museu Nacional. Mês passado, showzinho simpático (de uma banda cujo nome me escapa completamente) à beira do rio das Almas, em Pirenópolis, pela aprovação da PEC do Cerrado.

Vamo que vamo.

Deixem os mortos em paz ou façam direito

21/02/2010

Mais um fim de semana com cinebiografia. Camille Claudel. Não suportaria sequer um minuto a mais de música grandiosa ou atuação canastrona. No fim, tive que olhar e reolhar fotos de algumas de suas esculturas geniais, para dissipar o ranço provocado pelo filme.

Retrato de Camille Claudel. Paris, sem autor e data.

Gosto das coincidências, quando me convêm

20/02/2010

Hoje me apaixonei pelo departamento (estado) de Paysandú, no Uruguai. Não pus os pés fora de Brasília, mas gastei horas preguicentas flanando, na internet, pelo pequeno departamento às margens do rio Uruguai.

No site da intendencia (algo próximo a nosso governo estadual), uma notícia de ontem informa sobre a inauguração de um monumento contra a violência contra as mulheres. Além disso, eles parecem ter toda uma política de gênero, e andam fazendo muita coisa próxima ao que tentamos aqui — como encontros de mulheres rurais, apoio a seus grupos produtivos e ao desenvolvimento local.

Paysandú parece adivinhar o que gosto. Tem cemitério velho bacana! Ou melhor, um monumento à perpetuidade e o que parece uma política consistente de preservação do “patrimônio tumular”. Os caras o levam tão a sério, que comemoram ao estilo final de copa do mundo a vitória de Paysandú sobre Valparaiso (Chile) e Piracicaba (sim, a nossa!) na escolha da sede do XI Encuentro de la Red Iberoamericana de Valoración y Gestión de Cementerios Patrimoniales. (!)

Enfim, lá ia eu, olhando fotos (“preciso conhecer Casablanca, com seus prédios descorados e cantinhos de rio”), quando veio o golpe baixo, abaixo:

Barcos no rio Uruguai, no departamento de Paysandú. Do site da intendencia, sem autor e data.

Sobre violência

18/02/2010

Não é para chocar ninguém que escrevo, mas talvez para atenuar (botar pra algum lugar fora de mim) o horror e defender um ponto de vista.

Ontem, dia 17, um homem que vivia próximo a Feira de Santana matou a mulher, grávida de oito meses, me diz o Correio da Bahia. “Após uma discussão, a jovem teria corrido e tropeçado. Quando Joseane caiu, Alex esfaqueou-a na barriga.” E continua: “Segundo informações da TV Subaé, Alex abriu a barriga da jovem e arrancou a criança — que morreu na hora. A mulher chegou a ser socorrida para um hospital, mas não resistiu aos ferimentos”.

Acompanho um clipping de notícias diário que rastreia em veículos de todos os estados notícias com palavras-chave relacionadas às políticas para as mulheres. “Violência” combinada com “mulher” não é o único termo da busca. Longe disso; a expressão poderia, mesmo, se perder na infinidade de outras: há “agricultura familiar”, “poder”, “HIV”, “educação”, “quilombola” e por aí vai.

Apesar disso, há um claro desbalanceamento na presença de matérias sobre violência: espancamentos, cárcere privado, estupros, morte. Todos os dias (ou praticamente todos — não consigo lembrar de nenhum em que estivessem ausentes, mas não posso afirmar categoricamente sem dar uma olhada com mais calma) há notícias de mulheres assassinadas por seus companheiros ou ex-companheiros. O grau de crueldade da notícia a que aludi acima — como se isso fosse passível de se medir com uma régua, mas fiquemos provisoriamente com essa ideia — não é exceção. Claro que facadas e tiros predominam, mas não faltam mortes a pauladas e pedradas.

Não esboço qualquer estatística, mas faço duas observações em relação aos assassinatos: como muitas vezes são casais jovens e, em outras tantas, que se conheceram a não mais que, digamos, cinco meses; e como os motivos alegados são extremamente fúteis (ressalvando: não considero nenhum motivo válido para matar a companheira, mas há uns que saltam aos olhos, do tipo “ah, ela mexeu na minha coleção de DVDs”).

Vira e mexe sujeitos “esclarecidos” (seja lá o que for isso) defendem com veemência, nos grupos de e-mails em que perco meu tempo, que não, machismo, machismo não existe. Para quem não é dado a olhar os detalhes (eu sou; e enxergo sem dificuldade o sexismo na linguagem, nas brincadeiras, em certas colocações supostamente não discriminatórias), a enorme quantidade de mulheres que morrem por que há homens convencidos de que elas lhes pertencem deveria ser um argumento terminante.

Recorde

09/02/2010

Cheguei à metade d’Os versos satânicos, do Salman Rushdie, sem haver apanhado uma só vez no ônibus.

Brasília, jogo-me a teus pés

09/02/2010

Aqui eu compro seriguelas na banquinha da rua. Seriguelas!
(A 3 reais, o litro, ao lado do Ministério da Pesca; na frutaria da minha quadra, uma bandeja de 300-400 ml sai por 8 (!) contos.)